Instantes sem parágrafos

Conversas paralelas não desatavam sua voz do meu ouvido; assim como o seu hábito de estalar os dedos prendia minha atenção. Naquela mesa, naquele agora, eu não percebia ao redor o que eu percebo com outras companhias. E eu não sabia muito sobre você, mas sei que sei de mim, e não é normal eu me sentir assim. Até cogitei levantar e sair, sem consumir nada, e nunca mais voltar; nunca mais te atender. Mas me ocorreu que eu fujo toda vez que me apego, assim como me ocorreu o tempo, o desperdício e a solidão. Hoje me lembro que fiquei, e atravessamos, não só aquela noite, como muitas outras do meu calendário. Hoje os velhos hábitos são postos à prova; a língua traça outras frases, num outro tom de voz, que não era usado antes, e que iria enferrujar junto com as palavras entaladas na garganta. Hoje arrasto a semana amarrada aos meus pés, que já andaram desatados através dos dias, e foram à todos os lugares que são lugar algum. Bati em portas que me bateram na cara, e nas que se abriram eu não quis entrar; mas hoje enxerguei os instantes de um jeito diferente. Ontem pagaria o quanto fosse para não estar na situação da qual, hoje, pago o quanto for pra não sair. E as pessoas falam, falam, falam e falam, mas a música está alta, e eu não ouço nada; e se ouvisse não responderia; não há chances pro diálogo com quem quer monologar, e também não há pra mim, que estou com os ouvidos zunindo, com os lábios ocupados, e com as veias quentes de álcool e desejo de que à noite não termine num café frio no dia seguinte.