Doce

Chove aqui, chove lá;
fico contente,
doce de uva,
que a chuva sabe
que a gente cabe
num só guarda chuva.

Sol aqui, sol ali;
e a gente mente,
doce de pêssego,
que a gente sabe
que a gente entende;
e, sem que se fale
o que a gente sente,
ainda assim se vê que é lindo;
por mais que lindo, não rime com pêssego.

Mas que se coloque, mesmo sem rimas, nesse papel,
que quando a luz branca, que vem do azul céu,
se faz lápis de cor, e pinta olhos cor de mel;
penso eu, cá com meus botões:
É mel com própolis!
Que própolis e afeto fazem bem pra saúde.
Sobre a verdade
          Queridos, que me afagam e me cospem. Sou grato, por cada demonstração, da mais bela à mais infâme, de seus sentimentos. Por que se a vida não é, de fato, o paraíso divino pelo qual tenta se passar, É por quê não tem de ser. Não tem de ser perfeita, como uma esfera; tem de ser assim mesmo, quadrada, com lados, e vértices, por vezes, deveras afiados. Ora, o que seria de nós imersos na perfeição? Se essa falsa perfeição que nos estendem aos olhos, e o falso sentimento de coragem e auto-suficiência bordado no rosto de cada cidadão com direito à férias anuais já me enojam. Quem muito se diz ser, tem é medo de que descubram que não é.
          Então, amigos, andem e sejam; mas sejam quem de fato são, e não deixem que o conformismo vos peguem pelas pernas e os façam esquecer que tens uma essência única, pela qual todos anseiam por conhecer, sem mesmo saberem disso. É quando se tira a máscara, e se olha nos olhos do mundo como o eu, o mortal, o ingênuo, o inocente, o frágil, que o mundo te olha de volta, e as pessoas te olham de volta, e se encantam. Por isso agradeço aos que me abraçam, e aos que me cospem. Pois esses me vêem como sou, e me tratam, cada um ao seu modo, à partir disso.
          Quando se olha nos olhos do real, se vê que a perfeição reside exatamente na imperfeição. E que a busca por essa perfeição utópica é o que mantém as pessoas escondidas atrás dos seus próprios olhos, trancafiando seus sentimentos, e bradando que é isso que as deixa livres. Ninguém está livre de sentir. Você pode enjaular muita coisa dentro de você, é verdade; mas você não pode fazer com que essas coisas sumam. Ou você as deixa agir, ou você as aprisiona.
          Sentir, no sentido mais amplo da palavra; se deixar sentir. Talvez eu seja um tanto quanto intenso demais quando o assunto é me deixar fazer parte de algo que eu ache bonito no mundo, mas isso também faz parte de mim. Quem eu sou, ninguém nunca vai saber, sou um grande mosaico, sabe? Assim como você. Mas quando me permito ser descoberto, e descobrir, sem me sentir pressionado à nada, apenas a sorrir, é aí que a vida acontece. Deixe que a verdade te olhe nos olhos.
Loucura, ou seja lá qual for o título



          Loucura? Não. Mas cheguei num ponto onde as idéias me aprisionaram, cada pensamento e cada reflexão são como uma corrente que me amarram às pernas, e agora, explicitamente agora que queria andar e descobrir, não posso, estou atado. Tento tomar algo por verdade, algo por ponto de partida, mas não. Ou acredito em tudo, ou não acredito em nada. Ou estou em todos os lugares, ou em lugar algum. Esse é meu fardo, no momento. Preso no que li, ouvi e descobri a vida inteira. Uma idéia que afirma, outra que contradiz a primeira, mas logo vem outra pra se sobrepor à última.
          Loucura? Não sei. A busca do conhecimento é perigosa. Principalmente quando você, assim como eu fiz, busca o conhecimento levado apenas pela curiosidade cerebral, seja lá o que você entende por isso. O cérebro é um negócio muito louco. É, talvez, a maior obra da natureza, e está dentro da sua cabeça, te controlando e, mais que isso, sendo influênciado por outros cérebros.
          Loucura? Sim. Mas e daí? Quem se importa afinal? Quem ler isso vai achar isso ou aquilo e vai continuar fazendo as suas coisas, do seu jeito, ou do jeito que acha que deve, não sei. Só sentei pra escrever, e acabei escrevendo, veja só, que coisa! Idéias soltas, palavras que não valem nada, blablabla... Esse é, provavelmente, o texto mais solto que já escrevi, o que me faz pensar que comecei a escrever amarrado à uma bola de ferro, e agora estou correndo, cardíaco, por aí.