Sonho é destino – Parte VI

- Não me sai da cabeça algo que você me disse.
- Algo que eu disse?
- É. Sobre a sensação de que você observa a sua vida da perspectiva de uma velha à beira da morte. Lembra? Ainda me sinto assim, às vezes. Como se visse minha vida atrás de mim. Como se minha vida desperta fossem lembranças.
- Exatamente. Ouvi dizer que Tim Leary, quando estava morrendo, disse que olhava para seu corpo que estava morto, mas seu cérebro estava vivo. Aqueles 6 a 12 minutos de atividade cerebral depois que tudo se apaga. Um segundo nos sonhos é infinitamente mais longo do que na vida desperta. Entende?
- Claro. Tipo, eu acordo às 10:12h. Então, eu volto a dormir e tenho sonhos longos, complexos, que parecem durar horas. Aí eu acordo e são 10:13h.
- Exato. Então aqueles 6 a 12 minutos de atividade cerebral podem ser a sua vida inteira. Você é aquela velha, olhando para trás e vendo tudo.
- Se eu sou, o que você seria nisso?
- O que eu sou agora. Quero dizer, talvez eu só exista na sua mente. Eu sou apenas tão real quanto qualquer outra coisa.
- Andei pensando sobre algo que você disse. Sobre reencarnação, e de onde todas as novas almas vêm ao longo do tempo. Todo mundo sempre diz ser a reencarnação de Cleópatra ou de Alexandre, o Grande. Não passam de bestas quadradas, como todo mundo. Quer dizer, é impossível. A população mundial duplicou nos últimos 40 anos. Então, se você acredita nessa história egóica de ter uma alma eterna há 50% de chance da sua alma ter mais de 40 anos. Para que ela tenha mais de 150 anos, é uma chance em seis.
- Está dizendo que reencarnação não existe? Ou somos todos almas jovens? Metade de nós é de humanos de primeira viagem? O que você está...?
- Quero dizer...
- Aonde você quer chegar?
- Eu acredito que a reencarnação é uma expressão poética do que é a memória coletiva. Eu li um artigo de um bioquímico, não faz muito tempo.Ele dizia que, quando um membro de uma espécie nasce ele tem um bilhão de anos de memória para usar. É assim que herdamos nossos instintos.
- Eu gosto disso. É como se houvesse uma ordem telepática da qual nós fazemos parte, conscientes ou não. Isso explicaria os saltos aparentemente espontâneos, universais e inovadores na ciência e na arte. Como os mesmos resultados surgindo em toda parte, independentemente, sabe? Tipo, um cara num computador descobre algo e, simultaneamente várias outras pessoas descobrem a mesma coisa... Houve um estudo em que isolaram um grupo por um tempo e monitoraram suas habilidades em fazer palavras cruzadas em relação à população em geral. Então, deram-lhes um jogo da véspera, que as pessoas já tinham respondido. A sua pontuação subiu dramaticamente. Tipo 20%. É como se, uma vez que as respostas estão no ar, pudessem ser pescadas. É como se estivéssemos partilhando nossas experiências telepaticamente.

Fonte: Waking Life (2001)