Chuva

Estava almoçando no mesmo restaurante chinês de sempre; onde não havia um chinês sequer. Talvez um dos cozinheiros fosse chinês; mas acho que só me pareceu oriental porque eu sabia que o restaurante era chinês. O arroz era quente e a salada era fresca, de chinês mesmo só um bolinho frito de legumes, que também tomei por prato tipicamente oriental apenas porque o restaurante se dizia chinês; talvez tivesse algum tempero excêntrico ou algo assim na comida toda também, não sei. Meu paladar anda enfraquecendo por conta do cigarro, o que não é lá um mau negócio. Nada que me preocupe. Estava mesmo era preocupado com o tempo. Tempo, no caso, é o clima. Também não era lá uma grande preocupação afinal, mas já era alguma coisa, podia ao menos pensar sobre isso enquanto terminava o almoço. Almoçar sozinho te faz pensar em coisas como o clima.

Levantei, peguei minha bandeja e à levei até o balcão. Tem dias que acordo um cidadão exemplar, dou sinal, dou vez aos pedestres na faixa, levo a bandeja até o balcão. Tem dias que não. Paguei e saí. Lá fora começara uma garoa. Coloquei os óculos e acendi um cigarro como de costume. Andei. A garoa começou a borrar-me os óculos. Tirei-os. Cheguei até a moto e joguei o resto do cigarro fora. Saí rápido, parando por sobre as faixas, como quem está com pressa, mas esperando o sinal abrir, como quem não tem tanta pressa assim. Não me molhei muito.

Cheguei no hospital onde trabalho, passei os pés no tapete, bati o cartão, cumprimentei algumas pessoas que já tinham me cumprimentado pela manhã e fui até minha sala, meu carimbos, meus clipes, meu calendário e meu fax. Abri a janela. A chuva havia parado e o jardim do hospital estava muito bonito molhado e sem brilho. Ouvi alguém dizer que estava cheirando terra molhada, ri-me disso. Olhei para o portão lateral e tive vontade de fumar. Depois tive vontade de ir embora. Mas fechei a janela e pus-me à trabalhar.