Sentado aqui, onde devia trabalhar, pensoescrevo, assim mesmo, tudo junto, ao mesmo tempo. Não consigo mais separar um do outro. Entre o cérebro e as teclas, entre o lápis e o papel, passa minha vida, meu bem e meu mal. Feitos de energias, que não são mais do que sensações e intuições, certezas provisórias e uma pitada de fé sem sentido, são meus pensamentos, e neles me encontro como jamais alguém poderá me encontrar entre as esquinas e os semáfaros dessa cidade entediante. Me encontro nú, mais que isso, me encontro transparente, e consigo ver e ler meus sentimentos assim como pode-se ler esse momento iluminado de sinceridade que escrevo.
     Em mim há uma pequena ilha de esperança cercada por um mar calmo da mais medonha e, estranhamente, pacífica solidão. Uma esperança incosciente e irracional de que algum dia, alguma coisa irá acontecer nas nossas vidas. E essa quase-certeza, de que tal esperança é tão falsa quanto notas de trinta ou contos de fada, me perturba, e não consigo fugir disso.
     Mas o fato é que estou vivo, e que das várias alternativas suicídas que você encotra em qualquer farmácia, nenhuma aguçou minha coragem. Então me encontro aqui, nesse penhasco louco da vida, tentando atravessar sob esse fio de esperança que nos sustenta, da vida para a morte, equilibrando numa mão a genialidade e na outra a estupidez. Seres humanos, é só o que somos. Entre famintos e empanturrados, calçados e descalços, seres humanos.